Entram em vigor hoje, 13, partes dos
decretos
editados em fevereiro pelo presidente Jair Bolsonaro com o objetivo de desburocratizar e ampliar o
acesso a armas de fogo e munições no país.
Os textos trouxeram
novas regras para o Estatuto
do Desarmamento (Lei 10.826/2003), entre elas a que afasta o controle do Exército sobre a aquisição
e o registro de alguns armamentos e equipamentos e a que permite o porte simultâneo de até duas
armas de fogo por cidadãos.
Apenas parte dos quatro decretos entram em vigor pois, ontem, 12, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF),
Rosa
Weber, decidiu suspender 13 dispositivos, em resposta a cinco Ações Diretas de
Inconstitucionalidade. A medida deve ser julgada pelo plenário do STF em sessão virtual marcada para
sexta-feira, 16.
Na
decisão liminar, a
ministra destacou que, as mudanças feitas pelos
Decretos
10.627, 10.628, 10.629 e 10.630, de 12 de fevereiro de 2021, são incompatíveis com o sistema de
controle e fiscalização de armas instituído pelo Estatuto do Desarmamento. Além disso, segundo ela,
eles ultrapassam os limites do poder de regulamentar de leis atribuído ao presidente da República
pela Constituição Federal.
Outro fundamento apontado por Rosa Weber é o modelo contemporâneo
de segurança pública, que preconiza o controle rigoroso do acesso da população às armas, acessórios
e munições, em razão de seus efeitos prejudiciais sobre a segurança e o bem-estar da comunidade.
Para a ministra, é dever do Estado promover a segurança pública como princípio do direito à
vida.
A segurança pública é corolário do direito à vida. É a tutela prestada pelo Estado em
favor da vida digna, livre do medo, livre dos atos de barbárie que revoltam a consciência da
humanidade. O Estatuto do Desarmamento é o diploma legislativo que consubstancia os valores
constitucionais concernentes à proteção da vida humana e à promoção da segurança pública contra o
terror e a mortalidade provocada pelo uso indevido das armas de fogo, diz a decisão.
Na
ocasião da edição dos decretos com as mudanças, o presidente Jair Bolsonaro defendeu o direito de
armamento das pessoas. "Em 2005, via referendo, o povo decidiu pelo direito às armas e pela legítima
defesa", escreveu nas redes sociais.
Em 2019, o governo já havia editado decretos alterando a
regulamentação do
Estatuto
do Desarmamento, que também foram questionados no STF. Na ocasião, em manifestação à Corte, a
Advocacia-Geral da União (AGU) citou o referendo de outubro de 2005 em que 63% dos eleitores
rejeitaram a proibição da comercialização de armas de fogo e munições em território nacional, o que
demonstra que a maioria dos brasileiros é contrária à imposição de restrições excessivas à aquisição
de tais materiais.
De
acordo com o órgão, a eleição de Bolsonaro em 2018 confirmou essa vontade popular.
A
reportagem entrou em contato com a AGU e com o Palácio do Planalto sobre a decisão da ministra Rosa
Weber e aguarda retorno.
Dispositivos suspensosA
decisão liminar suspende a eficácia dos decretos nas seguintes questões:
- afastamento do
controle exercido pelo Comando do Exército sobre projéteis para armas de até 12,7 mm, máquinas e
prensas para recarga de munições e de diversos tipos de miras, como as telescópicas;
-
autorização para a prática de tiro recreativo em entidades e clubes de tiro, independentemente de
prévio registro dos praticantes;
- possibilidade de aquisição de até seis armas de fogo de
uso permitido por civis e oito armas por agentes estatais com simples declaração de necessidade, com
presunção de veracidade;
- comprovação, pelos CACs (caçadores, atiradores e colecionadores)
da capacidade técnica para o manuseio de armas de fogo por laudo de instrutor de tiro
desportivo;
- comprovação pelos CACs da aptidão psicológica para aquisição de arma mediante
laudo fornecido por psicólogo, dispensado o credenciamento na Polícia Federal;
- dispensa de
prévia autorização do Comando do Exército para que os CACs possam adquirir armas de fogo;
-
aumento do limite máximo de munições que podem ser adquiridas, anualmente, pelos CACs;
-
possibilidade do Comando do Exército autorizar os CACs a adquirir munições em número superior aos
limites preestabelecidos;
- aquisição de munições por entidades e escolas de tiro em
quantidade ilimitada;
- prática de tiro desportivo por adolescentes a partir dos 14 nos de
idade completos;
- validade do porte de armas para todo território nacional;
- porte
de trânsito dos CACs para armas de fogo municiadas; e
- porte simultâneo de até duas armas de
fogo por cidadãos.
Decretos alteradosUm dos
decretos alterados é o
9.845/2019 para
permitir que profissionais com direito a porte de armas, como Forças Armadas, polícias e membros da
magistratura e do Ministério Público, possam adquirir até seis armas de uso restrito. Antes, esse
limite era de quatro armas.
O
Decreto
9.846/2019 também foi atualizado para permitir que atiradores possam adquirir até 60 armas e
caçadores, até 30, sendo exigida autorização do Exército somente quando essas quantidades forem
superadas. A medida também eleva a quantidade de munições que podem ser adquiridas por essas
categorias, que passam a ser 2 mil para armas de uso restrito e 5 mil para armas de uso permitido. O
decreto ainda garante aos CACs o direito de transportar as armas utilizadas, por exemplo, em
treinamentos, exposições e competições, por qualquer itinerário entre o local da guarda e o local da
realização destes eventos.
O presidente também modificou o
Decreto
9.847/2019, que regulamenta o porte de arma de fogo, para permitir, por exemplo, que
profissionais com armas registradas no Exército possam usá-las na aplicação dos testes necessários à
emissão de laudos de capacidade técnica. A medida também estabelece, entre outras mudanças, novos
parâmetros para a análise do pedido de concessão de porte de armas, "cabendo à autoridade pública
levar em consideração as circunstâncias fáticas do caso, as atividades exercidas e os critérios
pessoais descritos pelo requerente, sobretudo aqueles que demonstrem risco à sua vida ou integridade
física, e justificar eventual indeferimento".
Por fim, foi atualizado o
Decreto
10.030/2019 para desclassificar alguns armamentos como Produtos Controlados pelo Exército
(PCEs), dispensar da necessidade de registro no Exército para comerciantes de armas de pressão (como
armas de chumbinho), a regulamentação da atividade dos praticantes de tiro recreativo e a
possibilidade da Receita Federal e dos CACs solicitarem autorização para importação de armas de fogo
e munição. O decreto ainda estabelece atribuição clara da competência do Exército para regulamentar
a atividade das escolas de tiro e do instrutor de tiro desportivo, e autoriza ainda o colecionamento
de armas semiautomáticas de uso restrito e automáticas com mais de 40 anos de
fabricação.
Fonte: FONTE: Andreia Verdélio/Agência Brasil | FOTO: Arquivo/Agência Brasil