Pelo menos mil produtores de leite dos municípios de Francisco Beltrão e Dois Vizinhos devem deixar a atividade no ano de 2021. O dado foi revelado na semana passada por Antoninho Fontanella, chefe do Departamento de Economia Rural (Deral) do Núcleo da Secretaria Estadual da Agricultura e Abastecimento (Seab) de Francisco Beltrão.

 

Segundo ele, além dos valores mais vantajosos das commodities - milho (em torno de R$ 90/saca de 60 quilos) e soja (em torno de R$ 170/saca de 60 quilos) -, outros fatores também estão fazendo com que os produtores se sintam atraídos por deixar a atividade que envolve a produção leiteira. “O que está fazendo eles pararem são a idade e a aposentadoria dos produtores. Além do que, o leite dá muito trabalho. Também tem os produtores que acharam por bem arrendar suas terras para produtores de soja. Vai reduzir mil produtores de leite somente nas regiões de Francisco Beltrão e Dois Vizinhos”.

 

Investimento e estiagem
Em 2020, nos 27 municípios de abrangência do Deral/Seab de Francisco Beltrão foram produzidos 791.720.000 litros de leite e Fontanella acredita que o fechamento desse ano possa ser ainda maior, em função dos investimentos que os produtores fizeram em tecnologia. “Os produtores que conseguiram, investiram nos sistemas free stall (áreas com camas individualizadas, corredores de acesso e pistas de trato) e compost barn (grande espaço físico coberto para descanso das vacas. Área revestida com serragem, sobras de corte de madeira e esterco compostado) e isso vai trazer bons resultados”.
Porém, a estiagem dos últimos meses também fez com que muitos desistissem da atividade, já que o baixo valor pago não é capaz de cobrir os custos de produção. “Chuvas abaixo do normal. Tivemos 770 milímetros nos últimos dez meses, quando o normal seria 1.600 a 1.700 milímetros. Isso dificultou muito o desenvolvimento das pastagens e a crise se agravou para os pequenos produtores”. 


Ruim para a região
Há alguns anos, muitos dos produtores de fumo da região foram incentivados a trocar a atividade pela produção de leite e Antoninho lembra que a mudança foi vista com bons olhos na época. “Tínhamos de dez a 11 mil produtores de fumo que migraram para o leite. Com isso, perdemos de 12 a 15 mil hectares de fumo e hoje temos apenas 1.200 hectares com a cultura. Agora, esses mesmos produtores estão deixando o leite, também, e isso é muito ruim para a economia de toda a região, porque mensalmente o leite movimenta a economia, ao contrário da soja, em que se recebe uma vez ao ano”.


Pato Branco
Na região de abrangência dos 15 municípios do Deral/Seab de Pato Branco, a situação é parecida. Segundo o chefe do Deral, Ivano Carniel, os altos custos de produção e a baixa remuneração faz com que muitos deixem a atividade. “Não sabemos precisar o número de produtores que estão deixando o leite e quem fica é o produtor mais estruturado e que tem animais com bom padrão genético. A estiagem de janeiro e fevereiro fez com que a capacidade de produção de silagem fosse dificultada”.


Quanto às pastagens naturais, essas foram prejudicadas pelas geadas no inverno. “Isso fez com que houvesse desistência de muitos produtores”.

 

Falta escala
Sidiclei Risso, produtor e presidente da Associação dos Produtores de Leite do Sudoeste do Paraná (Aproleite Sudoeste) que tem abrangência em 14 municípios da região, avalia que os que devam deixar a atividade são os produtores menos eficientes porque não vão conseguir manter uma escala de produção.


“É o mesmo que aconteceu na Europa e nos Estados Unidos. Vai diminuir o número de produtores, vai mexer muito pouco no número de animais e muito pouco na produção”.


Dedicação a outras atividades
De acordo com Sidiclei Risso, para quem tem poucos animais nem é vantajoso permanecer na atividade.


“Porque vai precisar de assistência técnica de qualidade e isso custa caro. Aí, fica à mercê do que tem disponível no mercado e não consegue poder de barganha nem na venda do leite e nem na compra de insumos, ambos por causa do baixo volume”.

 

Ainda de acordo com Sidiclei Risso, muitas famílias devem ser forçadas a deixar a atividade do leite porque conseguem renda de forma mais eficiente se houver dedicação a outras atividades, que exijam menos trabalho.

 

“Quem não tem área suficiente para produzir grãos, não consegue sobreviver porque também exige escala. Os pequenos precisam se dedicar a atividades que possam agregar valor na produção, como hortifruti ou embutidos, por exemplo”.

 

Situação preocupante
O presidente do Sindicato de Leite do Paraná (Sindileite-PR) e diretor do HE Laticínios, de Coronel Vivida, Eder Desconsi, segue a mesma linha de raciocínio de Sidiclei Risso, da Aproleite Sudoeste. Eder Desconsi afirma que há algum tempo vem observando as dificuldades dos pequenos produtores em se manterem na atividade e que os maiores estão conseguindo até um aumento na produtividade.


“Isso é preocupante porque é uma região de pequenos produtores e vemos que a crise chegou forte. Quem está saindo da atividade são os produtores menores, não tecnificados, enquanto que os tecnificados estão até aumentando suas médias diárias de captação”.

 

Eder revela ainda que o setor industrial também está passando por dificuldades: “principalmente porque todos os produtos que têm cotação em dólar, subiram”.


Não há sucessão
De acordo com Lino Zeni, diretor do Laticínio Alto Alegre, de Verê, a tendência é de que 6% a 7% dos produtores deixem a atividade em um ano, pelos motivos já mencionados, além de outras alternativas mais rentáveis aos agricultores. “Não há sucessão familiar para continuarem no leite, a margem está muito apertada e o custo de produção muito alto. Está fácil de vender os animais para outros produtores e também para açougues, que estão remunerando bem”, diz Lino. Além do produtor, diz ele, a indústria também está sofrendo com os altos custos de produção. “Tem o transporte, papelão, plástico e a mão de obra, tudo com alto valor”.

 

Foto/Legenda: Pequenos produtores estão sendo forçados a deixar a atividade do leite na região Sudoeste.



FONTE | FOTO: Jornal de Beltrão